sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Do Blog do Raimundo Sodre

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Uma homenagem à Neusa Rodrigues de Abaetetuba


Sobre O Artesão e Sonhos
Quero falar das maravilhas que se encerram em O Artesão dos Sonhos, conto agraciado com a Menção Honrosa no IX Concurso de Contos da Região Norte, promovido pela UFPA. Uma tragédia ribeirinha costurada com os tenazes fios do suspense e matizada com o gracioso lirismo caboclo. Um drama centrado na (desconcertante) imagem do artesão Cazuza exposta em silencioso recorte de jornal. Quero dizer da belezura que é o texto de O Artesão... quando revela, em passagens elegantemente elaboradas, as dores causadas pela morte de Cazuza. Mas não tenho a pretensão de me esmerar em viagens explicativas para a obra, mesmo porque, por ser iluminado pelos fachos de Zé Fogueteiro, o conto explica-se por si. Convido as pessoas de bom coração, portanto, a lerem o conto. Ele faz parte da coletânea publicada pela UFPA em edição que pode ser encontrada no campus do Guamá e no Núcleo de Artes, na Praça da República. O conto expõe, sutilmente, um mosaico de emoções arquitetado no palavreado que vinga na baixa do Tocantins.A autora, Neusa Rodrigues, mira-se no espelho do dialeto abaetetubense e se arvora por um caminho que vai muito além do proselitismo da língua. Assim, nos brinda com impressões, com imagens, com dores e sabores. Neusa na literatura, é cor, é som, é luz. É quase cinema. E ali, nos dizeres dos personagens, nas onomatopéias da vida, ali, eu vi Cazuza riscar o miriti com precisão, e ali, vi o charme do dialeto afrancesado, e ali, como todo crente, eu vi a ilha da Pacoca virando um mundo encantado de luz. E ali, eu vi, na morte do artesão Cazuza, que sonhos, não se resgatam. Sonhos se conquistam, se realizam. E vi também, que o som da esperança: Fiásss...Pei! Pei! Pei! O foguetório da vida, pelo menos para nós, que escrevemos sobre ela (mesmo quando falamos sobre a morte), Fiásss...Pei! Pei! Pei! Ele, o espocar dos sonhos, encanta exatamente, por vir liberto das aspas. Em O Artesão..., Neusa faz referências a modalidades particulares de utilização da linguagem, ao acervo histórico, religioso, aos costumes de nosso povo, em medidas, de tal grau envolventes, que nos transportam para as cenas. Esta prática literária, por vezes, é rotulada de Resgate Cultural. Um tipo de classificação que, fiel às nossas travessuras lingüísticas, eu ‘disconcordo’. Porque, ora, ora, só se resgata, só se recupera, aquilo que se perdeu. E nós, não perdemos absolutamente nada. O Artesão... nos mostra isso. Não perdemos, e nem perderemos. A nós, que tratamos com os ‘causos’, com a história (não aquela desgastada, no passado, mas esta aqui, viva no presente e promissora, no futuro). A nós que utilizamos a palavra como forma de resistência e como garantia de felicidades, de amores, de prazeres, canto e música, a nós, não nos cabe resgatar. A nós, nos cabe viver, e quem sabe, sob a leveza e o colorido das peças de miriti do artesão Cazuza. É bater e ver. Quando leio (e eu leio, leio, releio...) O Artesão dos Sonhos, sinto um orgulho danado de ter sonhos com as cores e o sotaque do paraense da beira.
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Do Folha de Abaetetuba: Confesso à vocês que ainda não conheço o conto mencionado, contudo, procurarei lê-lo. Se puderem, façam o mesmo. Considero importante quando a cultura abaetetubense é valorizada, divulgada e bem representada. Além de tudo, creio que a autora seja uma das Leitoras assíduas de nosso Blog.
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Um grande abraço!

4 Comments:

Unknown said...

Edu,eu também ainda não li o conto,mas conheço a autora,a qual,por sinal, é uma referência da cultura de nossa terra.Sou advogado,há mais de 15 anos vivo no Rio,mas minha família é do interior de Abaetetuba.Vou uma vez por ano lá,geralmente pela Festa de Conceição.Ano passado estive lá com uns amigos e mostrei a eles um evento denominado "Auto da Padroeira" o qual é feito por ela.Confesso que senti orgulho de mostrar a outras pessoas de fora aquele misto de arte,folclore e religiosidade popular, que enchem os olhos da gente.Um verdadeiro espetáculo a céu aberto!Este ano,como não ía dar para eu ir nas festividades de Conceição,estive lá pelos finados e passei alguns dias no interior.Para a minha surpresa,ouvi a voz dessa moça fazendo um programa na Rádio Conceição,à noite.Meu amigo,viajei impressionado com tamanho talento.Acredito que no interior,90% dos ribeirinhos ouvem aquele programa,é algo tão diferente quanto educativo.O pessoal da minha família,espera com a cervejo no gelo,chegar sexta e sábabo para ouvir essa moça fazer aquele programa.São essas coisas que nos inflam o ego de orgulho de ser abaetetubense.Vou tentar conseguir essa obra.Esse texto da homenagem está um primor.Parabéns pelo seu Blog.Continue assim:mostrando que na nossa terra tem valores e talentos.
Um abraço
Aramis Cardoso

Anônimo said...

Parabéns pelo blog, Edu.
Sou amiga particular dessa sumidade da cultura abaetetubense chamada Neusa Rodrigues. Já li o conto e concordo plenamente com o que disse Raimundo Sodré. Ela é uma artista completa e caprichosa em tudo que faz. Perfeita.
Tenho orgulho de tê-la como amiga e de ser filha (quase nata) dessa terra que me acolheu desde criança.
Por isso eu a valorizo e a amo.

Cléa Mendes - professora

Anônimo said...

Edu,como a internet encurta a distância e aproxima as pessoas separadas pelas circunstâncias da vida:Neusa Rodrigues de Abaetetuba foi minha colega de faculdade.Ela sempre foi um talento ímpar.Era quem escrevia nossos trabalhos!Comprei esse livro ano passado,por acaso,e fiquei extremamente emocionado quando deparei com esse conto dessa amiga inesquecível.O conto está no livro "Os 13 Contistas da Amazônia",publicado pelo Núcleo de Arte da Ufpa.Quem ainda não leu,está perdendo a oportunidade de "viajar" nas bajaras de miriti para o mais recôndito manancial da criatividade e do lirismo amazônico.Nele,a vida ribeirinha é retratada pelo talento literário de Neusa Rodrigues com leveza e maestria de uma escritora que Abaetetuba deveria se orgulhar de tê-la concebido...E o que falta ser dito:Neusa compõe,toca,canta e cria coisas maravilhosas que eu acho que não são divulgadas.Escreve peças teatrais e dirige.É uma Poeta de "verbo lapidado" em terras de João de Jesus e Dira Paes.Não sou de Abaetetuba,mas, para mim,Neusa Rodrigues é um grande referencial da cultura daquela terra,um talento que encontra na terra natal inspiração para fazer sua arte.Que saudades dela!
Abaetetuba também está de parabéns por ter este Blog a serviço de suas comunidades.Parabéns,Edu!
Jorge Moreira-Professor e Poeta

Anônimo said...

Parabéns pelo blog,Edu. É muito interessnte. Estou afastada de Abaetetuba há algum tempo (moro em Belém), e encontrei nesse blog uma maneira de "estar" aí e matar saudades.
Quanto ao conto de Neusa Rodrigues, é realmente, digno de premiação e orgulho. Eu, como amiga particular dessa sumidade, sinto-me honrada em tê-la como amiga. Ela é, realmente, uma artista completa e representante da arte abaetetubense