quarta-feira, 16 de setembro de 2009

ARTES VISUAIS: E DO MIRITI NASCE A OBRA

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Junte os materiais: um saco plástico (daqueles de supermercado mesmo), talas de miriti, cola branca (usada nas atividades escolares) e um rolo de linha fina. Una as talas em forma de losango, amarre as pontas com a linha, cubra as talas com cola e depois ponha o plástico em volta. Corte pedaços de plástico e amarre na linha. Depois disso, amarre a linha com o plástico a uma das pontas do losango. Pronto, está feita uma pipa. Durante a infância, o artista plástico Francelino Mesquita passava horas seguindo essas instruções, confeccionando o brinquedo, que servia não só para sua diversão, mas para seu sustento. As tardes que ele passava empinando ou fazendo as pipas e papagaios, porém, não foram em vão. A habilidade em manejar as talas do miriti foi gradativamente amadurecida e ele começou a criar técnicas em que a matéria-prima - muito conhecida por ser a base de barquinhos, casinhas e bichos comuns durante o Círio –, se transformava em escultura, redimensionando o que se tem como espaço e volume na produção de uma obra. A habilidade de pensar outras utilidades para uma matéria-prima tão comum durante as oficinas da Fundação Curro Velho deu a Francelino o prêmio Cobra Criada em 1999. “Esse prêmio me incentivou a continuar produzindo esculturas com as talas e também serviu para que eu continuasse pesquisando sobre as formas possíveis com esse material. A ideia de fazer esculturas com as talas surgiu em 1995, quando eu fazia pipa mesmo”, conta o artista. Francelino era também abridor de letras. Nas exposições que aconteciam em Belém na década de 1990, era ele quem escrevia cuidadosamente as informações sobre a curadoria nas paredes de museus e galerias. O contato com essas instituições foi então fundamental para que ele tomasse conhecimento de que suas esculturas não eram simplesmente peças artesanais. As formas tridimensionais feitas com a bucha, o sabugo e as talas do miritizeiro começaram a chamar a atenção de outros artistas em Belém. “Ele já tinha facilidade e afinidade com o material e frequentava as galerias. De repente, começou a inscrever em salões obras produzidas com a técnica que ele criou”, diz o artista plástico Emanuel Franco, também curador da exposição “Miribolantes”, que abre hoje, às 20 horas, na Galeria de Arte Graça Landeira, com 40 esculturas de Francelino.Além da habilidade que vem da infância, Francelino Mesquita é técnico de edificações, o que permitiu que as formas tridimensionais e geométricas fossem melhor executadas em consonância com a leveza, o peso e o equilíbrio do material. Em 2008, com a Bolsa de Incentivo à Criação Artística, do Instituto de Artes do Pará (IAP), ele foi até Abaetetuba, no interior do Estado, conhecer de perto o trabalho dos mestres do miriti. “Ele tem um trabalho significativo de pesquisa dentro desta técnica, da conjugação de todas as partes do miritizeiro. É um artista muito consciente do que faz e isso é importante”, analisa o curador. Emanuel Franco lembra também da importância da pesquisa de manejos com materiais regionais. “Temos na nossa região uma carência de escultores, e quando Francelino apresenta esculturas com o miriti, mostra uma construção contemporânea, e não artesanal”. Talvez esteja aí o mérito do trabalho do artista.
(Diário do Pará)
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